terça-feira, 23 de novembro de 2010

Carta aos Companheiros

Olá Companheiros,


Neste sábado, não fomos ao Estádio de Pituaçú fazer nosso laboratório, como desejava Companheira Matilde. Mas, se repararem, estamos vivendo, em nossas casas, um laboratório fantástico hoje.


Brincadeiras à parte, agora enquanto escrevo, ouço fogos de artifício, que assustam os meus cachorros, ouço gritos do meu vizinho de “Bahêa, minha poha”, que incomodam a minha mãe. Passei por ruas que por hora estavam desertas, mas que, em breve, se tornarão palco de um carnaval. Recebi, momentos antes, a notícia de que meu irmão foi perseguido na rua por alguns caras, creio que por ser torcedor do Vitória, e só não lhe aconteceu nada porque, graças a Deus, ele é bastante veloz e conseguiu chegar à casa de um amigo a tempo.


Sempre que penso no texto que escolhemos pra nossa montagem final, sempre que assisto filmes e vídeos, sempre que discuto sobre o tema, sempre que estudo o texto de alguma forma, me lembro da nossa primeira reunião, onde Elaine levantou o questionamento: Por que montar Campeões do Mundo hoje? E sempre que penso nisso, uma música, ou melhor, algumas me vêm à mente, para responder. Dentre elas uma me chama muito a atenção e reforça pra mim o quão atual é este tema. Que voltou a minha mente, quando pensei na importância que se tornou essa vitória do Bahia.


Como lembrou Lucílio, o tema principal deste texto não é a ditadura. É o poder. O poder que a mídia exerce sobre as pessoas, o poder que a massa tem, o poder que as grandes distrações exercem sobre a sociedade. As pessoas que remaram contra aquela maré de tranqüilidade e progresso que se alcançava com a Ordem estabelecida sob o comando militar, não poderiam, realmente, serem vista com bons olhos.


Hoje não é mais a ditadura que nos oprime. Vivemos num regime democrático. Onde um partido de esquerda assume o cargo político mais importante. Agora sob a batuta de uma mulher, e mais, ex-militante. Não podíamos estar vivendo um período mais diferente do que aquele vivido pelos personagens de nosso texto. Mas tudo é tão igual. O que há de errado, então?


A mídia ainda exerce muita influência em todos. Sem exceções. E esse domínio é cada vez maior, e por meios de comunicação cada vez mais diversos. Fabricam, todos os dias, heróis e vilões, a seu bel prazer. E a população, como se acompanhasse uma novela, esquece o antigo herói assim que aparece um novo. Esquece o antigo vilão, assim que outro faz o que parece ser mais cruel. Mas, como não acredito na existência de um medidor para a crueldade, afirmo: é apenas mais atual.


Pessoas que se manifestavam contra o regime eram punidas, se dessem sorte, eram, de acordo com o “Brasil, ame-o ou deixe-o”, mandadas para fora do país, ou, outras com menos sorte, simplesmente desapareciam. Hoje, experimente denunciar um traficante e ser descoberto por ele. Militantes ainda morrem, aqui, no Amazonas e em outros estados, vira e mexe sai uma noticia por aí. Pessoas se calam por medo.


Alguns pensam que hoje, se comparado ao período, há paz. Que hoje não há uma censura pra nos proibir de falar. Só peço que se lembrem que naquele período também havia pessoas que se viam num mar de paz. E sim, hoje, podemos falar. Não nos faltam meios de comunicação, mas não há pessoas pra ler. Pois a grande maioria prefere não se envolver com este tema e acompanhar as novelas dos heróis e vilões que falei anteriormente.


Isso tudo me veio à mente, ao pensar na vitória do Bahia, e no frisson que isso causou. Adoro futebol, e num Estádio, torcendo pelo Vitória, fico ensandecida. Mas por que todo esse reboliço porque o Bahia subiu? Com tanta coisa acontecendo. Há poucas semanas íamos às urnas para escolher quem exerceria o cargo mais alto na nossa política por 4 anos, sem contar com governadores e os deputados, e nessa hora, cadê o povo? Ouvi muitos reclamarem que esta eleição estava vergonhosa, que, na urna, iriam votar no “menos pior” ... Nessa hora cadê o povo? Todo dia morre um aqui no nordeste (meu bairro), ou um é assaltado a caminho do trabalho, aqui ou em qualquer lugar... Nessa hora, cadê o povo?


Dessa vez, nós, atores, artistas, é que remamos contra a maré. Não podemos seqüestrar um embaixador, pra chamar a atenção do país, mas podemos subir no palco e dizer. O que quisermos, e como quisermos. Não é algo imediato, é um trabalho de formiguinha. Mas lá podemos ser os “ Campeões do mundo”.

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